sábado, 11 de fevereiro de 2012

Manhã no condomínio




Clarice amanheceu naquele dia, como fazia todas as manhãs. Tomou o café evitando as notícias do mundo. Que ultimamente as deixavam em cólera. Gostava de reservar as primeiras horas do dia para si. Era uma forma de se resgatar. Olhou para o relógio, mas ainda era cedo. Sentiu o tempo correr vagarosamente como se o mesmo estivesse pregando uma peça. O condomínio onde morava ainda adormecia. O que era um alívio. Apesar de morar só, sentia a presença alheia invadir a intimidade. Mas perdoava. Sua retina também capturava esses pequenos fragmentos de vida solta. Um abrir de geladeira, a concentração de um rapaz ao ler seu livro, uma dança constrangedora num momento de solidão, um beijo roubado... Outro dia observou uma partida de xadrez entre dois amigos na varanda vizinha. Estes não notaram seu interesse. Distraídos na concentração de um querer aniquilar o outro. Imaginou quem daria o golpe fatal. Captar essas atmosferas íntimas também era uma forma de descobrir o mundo. Voltou sua atenção para a xícara de café e viu que tinha tomado só a metade. O tempo agora corria insensível. Como sempre faz quando menos se espera dele. Pensar demais às vezes lhe proporcionava isso. A estranha sensação de uma xícara de café deixada pela metade.

Por: Nadja Lopes

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